Dar uma espiada no
perfil de um parceiro ou amigo é a coisa mais natural do mundo. Mas exagerar
pode ser perigoso
Você já teve a sensação que entra mais vezes do que deveria
no perfil do Facebook de algum amigo? Ou talvez de um ex ou desafeto? Talvez
alguém também esteja fazendo o mesmo com você: sabe na ponta da língua onde
você estava no último sábado à noite e conhece detalhes da última viagem. As
redes sociais são ótimas para quem gosta de se informar sobre a vida de
conhecidos, e também quem gosta de mostrar o que acontece em sua própria vida.
Mas algumas vezes essa curiosidade toma proporções
exageradas e é aí que começa um problema que se torna cada vez mais comum: o
vício em vigiar a vida de outras pessoas através das redes sociais, também
conhecido como cyberstalking.
O profissional autônomo Leandro Prudente, 26, confessa que
não conseguiria ficar sem seus perfis nas redes sociais. Ele diz que já se
sentiu vigiado e também já vigiou. “Cheguei a criar um perfil anônimo para que
a pessoa não soubesse que visitei a página dela”, conta. Leandro não é o
primeiro e nem será o último a fazer isso. Muitos lançam mão do mesmo artifício,
de criar um segundo perfil, para obter anonimato diante de algumas ferramentas
inovadoras que pipocam vez ou outra nas redes.
“Eu já cheguei a ficar com a página de uma pessoa aberta o
dia todo. Atualizava de tempos em tempos para ver se tinha algo novo”, conta
Leandro. Mesmo diante dessas situações, ele afirma que não é obcecado em vigiar
a vida alheia. “Não deixo de viver a minha vida para ficar olhando perfil de
outras pessoas.”
O LIMITE
“A proposta da rede social é justamente olhar e ser olhado. Se a informação está ali é para ser lida. Se colocam fotos, é para que todos possam vê-las”, afirma o psicólogo Erick Itakura, membro do Núcleo de Pesquisa em Psicologia e Informática (NPPI) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Erick explica que o brasileiro ainda não entende completamente as consequências da exposição exagerada de sua vida pessoal pela internet. “Em outros países vemos que as pessoas são mais seletivas. Não é aconselhável expor demais sua intimidade. Quando se usa de forma correta, não há nada de errado com as redes sociais, mas hoje em dia é cada vez mais comum que pessoas se peguem vigiando outras através dos perfis”, afirma.
Erick explica que quando o online se torna mais importante
do que o real, o problema, normalmente, já está instalado. “Deixar de falar,
ver, visitar ou ligar para amigos e familiares apenas para se dedicar às redes
sociais significa que algo está errado. Ficar o tempo inteiro olhando a vida de
uma pessoa, também. Nestes casos é necessário fazer um tratamento para que isso
possa ser revertido”, afirma.
A psicóloga Luciana Ruffo, do NPPI da PUC-SP, esclarece que
existem sinais que mostram quando alguma coisa errada. “Se a pessoa não
consegue ficar sem entrar em um determinado perfil por algumas horas, ou se tem
algum compromisso, mas antes precisa se informar sobre o que acontece naquele
momento com outra pessoa, demonstra um comportamento que precisa ser repensado
ou tratado.”
“Quando a gente diz que uma pessoa é viciada significa que
ela deixa de fazer algo para se dedicar ao vício. Um exemplo é o funcionário
que apresenta queda de produtividade porque fica o dia inteiro vendo o que
outra pessoa está postando no Facebook. Quando chega neste ponto, algum tipo de
distúrbio está se manifestando”, explica Erick.
ACORDO
O controle exercido através do monitoramento do perfil de uma pessoa é um
caminho cada vez mais trilhado pelos casais que mantém páginas em redes
sociais. São homens e mulheres que observam atentamente os recados deixados
pelos amigos do parceiro, por exemplo.
A ressalva feita por Luciana é a de que o monitoramento deve
ser de comum acordo do casal. Neste caso, não há problemas. “O que não dá é
para ser unilateral. Outras coisas que não podem acontecer são roubos de senhas
ou mesmo apagar mensagens do outro para afastar algumas pessoas da vida do
parceiro.”
De acordo com Luciana as mulheres gostam mais de vigiar do
que os homens. “Mulheres demonstram ter mais necessidade de uma vida social
rica em detalhes. Elas têm mais curiosidade. O homem não precisa saber tantos
detalhes assim”, explica.
QUANDO VIGIAR É CRIME
O que fazer quando você é quem está sendo constantemente vigiado ou monitorado?
Luciana diz que tudo depende de quem é o perseguidor. “Se é alguém conhecido
você pode tentar conversar com essa pessoa ou simplesmente excluí-la da lista
de amigos e fechar seu perfil para desconhecidos. Se for um estranho, é preciso
procurar ajuda jurídica.”
“Meu ex-namorado me monitorava através da minha página em um
site de relacionamento pessoal. Ele roubou minhas senhas e chegou a se passar
por mim em algumas conversas com amigas para descobrir se eu o traía”, conta
uma advogada gaúcha de 30 anos que prefere não se identificar. A advogada
procurou a polícia e conseguiu se livrar do ex. Ficou três anos longe das redes
sociais e até hoje toma muito cuidado com o que escreve. “Fiquei traumatizada.
Durante muito tempo não consegui manter uma conversa normal pela internet”,
conta.
O advogado e autor do livro “A invasão da privacidade
através da Internet” (Editora e Livraria JM) Guilherme Tomizawa explica que a
pessoa que se sentir prejudicada deve procurar uma delegacia e fazer um boletim
de ocorrência. “A invasão de privacidade tem consequências civis e penais. Tudo
depende de como os dados que a pessoa obtém são usados.”
O advogado aconselha as pessoas que precisarem abrir um
processo judicial a procurarem um cartório para que o tabelião faça uma cópia
da página na internet que possa ser considerada uma prova de que um crime está
sendo cometido, como xingamentos que alguém deixou no seu perfil que possam
caracterizar difamação, injúria ou calúnia.
“Hoje está bem mais fácil detectar
crimes cometidos através da internet. As pessoas não podem achar que o
computador é garantia de impunidade”, afirma.
Fonte: iG
Delas Danielle Nordi