Pedais e câmbio são instrumentos de tortura. Do lado de
fora, os espelhos parecem refletir a imagem de inúmeros monstros que estão
dispostos a apavorar você. O volante guia em uma estrada que parece levar a um
fim desastroso… Ok exageramos. Mas não é raro encontrar homens e mulheres
com uma fobia de dirigir tão grande quanto qualquer bicho-papão que a
imaginação infantil pode vir a criar. Esse é um problema bastante sério e deve
ser tratado. Quais são as razões para esse bloqueio? Por que será que, mesmo
após obter a CNH, existem muitos motoristas reféns de seus carros?
Na maioria dos casos, existe um perfil de pessoas com maior
potencial de desenvolver este distúrbio. “São pessoas que não gostam de se
expor, ouvir uma crítica mais dura ou ser xingada. E essas são coisas
corriqueiras no trânsito. Caracterizam-se por serem muito autocríticas e
perfeccionistas”, identifica a psicóloga especialista em comportamento
do motorista Cecília Bellina. Ainda segundo ela, com o trânsito cada
vez mais caótico e agressivo, onde a pressão e a impaciência reinam absolutas,
o sentimento de medo entre os motoristas pode se desenvolver mais facilmente.
As mulheres são mais vulneráveis neste caso. Com um perfil
mais emocional, elas se sentem atormentadas pela pressão do trânsito. “A
pressão é muito maior para elas. Hoje em dia ainda encontramos muitos
motoristas que dão fechadas e bradam que lugar de mulher é no tanque”, aponta a chefe
do Centro de Psicologia Aplicada da UERJ, Maria Luiza Bustamante. Ela
lembra ainda o valor simbólico do carro na nossa sociedade. “Não faz muito
tempo que as mulheres não tinham sequer o direito de gerir seus bens.
Essa
mudança é muito recente e os homens ainda têm preconceito, o qual transmitem a
elas. Ter carro é poder dirigir a sua vida, o poder de se deslocar
sem dar satisfação a ninguém”, completa.
No entanto, não há nada que gere mais temor aos motoristas
do que os acidentes. Segundo Bellina, o tempo de aprendizado nas autoescolas é
curto e muitos são aqueles condutores habilitados, mas ainda inseguros. “Aí, a
pessoa sai e provoca algum incidente e se traumatiza. Muitas vezes, ela nem
chega a se envolver em acidente, mas toma um susto muito grande e decreta a si
mesma: ‘Isso não é para mim’”, diz a psicóloga. “O sentimento de culpa também
contribui e muito. Se for uma mulher, ela se sente ainda mais frustrada por ter
falhado na missão de quebrar o tabu de que as mulheres dirigem mal. E o
resultado: perde a confiança em si mesma como motorista”, completa Bustamante.
Como superar o medo?
“Para perder o medo, tem que dirigir”, assegura Bellina. Vivenciar
o objeto da fobia e acostumar-se a lidar com o sentimento são essenciais para
superar o medo. Mas tudo deve ser feito em doses homeopáticas. “Primeiro,
temos que revisar o aprendizado da direção, corrigir os erros técnicos para dar
segurança à pessoa. Depois, partindo para o lado psicológico, é começar a
realizar pequenas tarefas, como dar uma volta no quarteirão”, ensina a
psicóloga. “Aos poucos, conforme se ganha confiança, aumentam-se os trajetos”.
Se você tem tido pavor de sentar ao volante, saiba: nem
todo medo é sinônimo de fobia. “Existe uma diferença entre o medo
patológico e o medo sadio. O medo sadio é aquele instinto de
responsabilidade e autoproteção, essencial para não cometermos delírios no
trânsito. Quando o medo começar a atrapalhar a sua vida, como deixar de ir a
determinado local porque não quer dirigir, aí já é hora de procurar um
psicólogo”, diagnostica Cecília.
Veja algumas dicas de Cecília Bellina para
solucionar o problema:
- Assuma o sentimento, não sinta vergonha do medo de
dirigir, pois este é um problema muito comum e que não é impossível de se
resolver.
- Sinta-se motivado a dirigir. Enfrente o problema do medo
para tentar resolvê-lo.
- Nunca desista.
- Não veja o carro como algo estranho a você. Com o
tratamento adequado e o tempo necessário, você verá seu veículo como um
instrumento de conquista da sua liberdade.
Autoajuda
Como toda fobia, existem estudos de casos e métodos que
tentam ajudar a superar o medo. A literatura de autoajuda procura analisar e
trabalhar as questões que levam a pessoa a ter aversão ao volante, como o livro
“Vença o medo de dirigir” (ed. Gente), de Neuza Corassa. Entrar em contato com
a insegurança e suas causas pode ser o primeiro passo para solucionar o
problema. O segundo é em direção ao carro.
Algumas dicas para
superar o medo:
• Entender a parte mecânica ajuda a dar segurança. Se tiver
dúvidas, pergunte.
• Começar dirigindo em locais com pouco movimento de carros
e pedestres.
• O carro morreu e o motorista de trás já começou a buzinar?
Mantenha a calma e dê a partida novamente. Sempre vai existir gente estressada
no trânsito.
• No início evite dirigir com música ou conversando com quem
estiver ao seu lado. Concentre-se no trânsito.
• Aprenda a escutar os barulhos do carro. “Ele pede para
trocar a marcha, para reduzir. São sinais importantes”, diz Claudia Gracindo.
• Quando tiver mais firmeza no volante grave duas ou três
músicas de sua preferência, repetidamente, até esgotar o espaço do CD. “Escolha
as que tiverem letra em português, para acompanhar com facilidade”, sugere a
psicóloga Claudia Gracindo. Gostando da música, você vai acabar cantando.
“Ajuda a controlar a ansiedade e não distrai tanto quanto o rádio”, explica a
psicóloga.