A provocação era a seguinte:"O homem só vira homem
quando nasce como pai?"Sou especialista nisso não. Sou pai, e olha lá. De
três: 8, 6 e 2 anos, respectivamente. Serial father, como queiram. Não se é pai
por vocação, concluo. Nunca ouvi o tal chamado, e não tive nada próximo de uma
epifania em momento algum, do parto à ajuda com a lição de casa.
Imagino que funcione diferente com as fêmeas da espécie,
brincadeiras com bonecas lapidando desde cedo o mítico "instinto
materno". De nossa parte, resta vestir a camisa de provedor,
proporcionando custe o quanto custar condições para o sustento da prole.
Fim das contas, pai é quem cria. Ou melhor, é quem troca a
fralda.
Nessa área do conhecimento humano como em inúmeras outras, a
prática leva à perfeição. Se tenho alguma dica? Meia dúzia.
1. Esteja preparado. Leve fraldas (mais de uma)
pra qualquer lugar em que você leve o bebê. Tenha à mão também uma troca de
roupa, lenços umedecidos, mais algo com que forrar a superfície onde a fralda
será trocada. Porque fraldas serão trocadas.
2. Posicione as peças no tabuleiro. Superfície
forrada, bebê deitado de barriga pra cima, pés na sua direção, ou de lado,
cabeça à sua esquerda se você for destro. Fralda limpa e lenços ao alcance das
suas mãos, mas não das mãos do bebê. Ou dos pés do bebê, convém jamais
subestimá-los.
3. Respire fundo. Metáfora nenhuma prepara o pai
pra esse primeiro enfrentamento. Do primal e inodoro mecônio à diarreia
cortesia da virose da estação, muda o aroma como muda o cardápio: uma coisa é o
que se vê na fralda dum bebê ainda lactente, outra é direta consequência do
sofisma "comida de gente, coco de gente".
4. Desembrulhe o pacote. Sinta-se, se isso te
ajudar, um marine em missão em Bagdá. Bomb squad, OK? Importante não demonstrar
medo, insegurança ou nojinho, nesse caso dando munição pro bullying eterno por
parte da sogra, que telepaticamente comunicará que já sabia que você não
prestava pra nada. Exale confiança enquanto avalia o tamanho da encrenca.
5. Meta a mão na massa. A limpeza começa com a
própria fralda. Movimentos sempre de frente pra trás, removendo o que for
possível e então lançando mão dos lenços umedecidos. Não há momento mais
"mão na massa" que esse: encha o peito de orgulho enquanto dá lustro
em cada reentrância (acredite, bebês meninas são menos complicadas do que se
imagina), mantendo-se alerta contra eventuais "lançamentos a descoberto".
6. Finalize. ?Bebê limpo é bebê feliz. Recoloque
a fralda sem deixá-la apertada ou frouxa demais. ?Rule of thumb? ?Um dedo de
folga na cintura. Roupa de volta no lugar, essa é a hora de entregar o bebê a
alguém, caprichando no ar de "missão cumprida" enquanto os despojos
são cuidadosamente descartados.
Tenha em mente, ninguém nasce sabendo. É desse tipo de
experiência que se constitui a tal paternidade: você põe alguém no mundo, esse
alguém faz caca, você dá uma força ainda que sob protestos e estão todos
prontos pra próxima cagada.
Fonte: Portal Homem por Érico Veríssimo
Engole o choro,
papai (Imagem: ThinkStock)