Zé Pretinho e seu mundo muito bizarro

Quando você entra no mundo de Zé Pretinho dá até para ter a impressão de que se está em um cenário de filme de terror!Essa sensação dura só até você conhecer o dono do lugar. Com sua fala mansa, o olhar doce e as mãos calejadas de quem, desde criança trabalha com a terra, Zé Pretinho adora conversar e conta quantas vezes você quiser a história de cada um dos bonecos em seu terreno.



Essa sensação dura só até você conhecer o dono do lugar. Com sua fala mansa, o olhar doce e as mãos calejadas de quem, desde criança trabalha com a terra, Zé Pretinho adora conversar e conta quantas vezes você quiser a história de cada um dos bonecos em seu terreno.


Zé Pretinho, 61 anos, nasceu Elenildo Domingues da Silva, em 1952, na cidade de Quatá, interior de São Paulo, e cresceu em uma fazenda chamada Prosperidade que, segundo ele, de prosperidade, não tinha nada. Em 1962, aos 10 anos de idade, ele veio para São Paulo. Primeiro ele morou em Itapecerica da Serra e, depois, mudou-se para o terreno em que mora até hoje, na Vila Eldorado, em Diadema.


Aos 60 anos de idade, Zé Pretinho tira seu sustento de trabalhos de jardinagem e paisagismo. O santuário dos brinquedos quebrados é algo que ele faz porque quer e porque sua inspiração manda.


O trabalho de Zé Pretinho em seu terreno é uma obra em andamento em que ele consegue imprimir suas frases. Apesar do trabalho que ele faz com os brinquedos, ele acha que o mais importante são as frases que ele cria.


A obra do Zé Pretinho no terreno começou pra valer no Natal de 2007 quando ele reparou que havia uma grande quantidade de brinquedos velhos jogados no lixo. Ele levou todos para casa e, na madrugada, sentindo o cheiro da comida passou a trabalhar neles. Naquela noite, ele estava triste, mas os brinquedos deram-lhe um motivo para sorrir.


Todos os dias, Zé Pretinho pega jornais para ler e para se informar a respeito do mundo. Ele não usa pirógrafo para gravar suas palavras na madeira. É tudo feito com ferro em brasa mesmo.


— Ninguém veio ao mundo por acaso. Todo mundo está aqui com uma missão. Eu me realizo com os meus brinquedos. É bom quando eu dou algum deles pros meus sobrinhos, para as crianças que vêm aqui.


Naquele fatídico Natal de 2007, Zé Pretinho se lembrou de um outro Natal, o de 1962, ano em que chegou em São Paulo e passou pelo Viaduto do Chá, observando de olhos vidrados a movimentação em torno das compras para as festas. Ele nunca havia visto brinquedos porque, criado em fazenda, diz ele, brinquedo era enxada.


O terreno do Zé Pretinho fica exatamente em frente a um ponto de ônibus bastante movimentado e, por causa disso, é normal que os curiosos entrem em sua propriedade para olhar de perto aquele cenário que consegue ser ao mesmo tempo mágico e assustador.


Com suas montagens de bonecos e brinquedos, o artista urbano presta homenagem a pessoas que estão na mídia.


— Esses bonecos que o senhor tá vendo aí, pra mim, eles são pra melhorar um pouco a mente. Eu gosto muito de fazer isso. As minhas obras são assim: eu vivo no passado, mas vivo atualizado também.


— Minha cerca é arte pública. Ela toma sol, ela toma chuva e, quando acabou um boneco, eu ressuscito. Então, é a ressurreição dos bonecos.


Se você tiver alguma ilusão a respeito de ser famoso, vá visitar a casa do Zé Pretinho. Se não houver uma boneca com a sua cara pregada na cerca dele, lamento: você não é famoso.


Justin Bieber também deu as caras por lá. Certeza que o Zé Pretinho escolheu esse boneco só por causa da franjinha.


— Quando eu era criança, não tinha brinquedo não. Então, agora, eu me realizo.


Quando alguma celebridade se vai, é certo que ela receberá uma homenagem. Whitney Houston, por exemplo, tem a admiração de Zé Pretinho.


A mesma coisa com Amy Winehouse.


Não são apenas as celebridades que o Zé Pretinho retrata. Ele também faz um boneco para cada uma das figurinhas que existem no mundo que cerca a sua vizinhança. Ele fica de olho nos famosos e nas pessoas que estão em evidência, mas nem por isso deixa de prestar atenção na sua vizinhança.


A obra de Zé Pretinho não sai só das notícias. Aqui ele usa, por exemplo, uma delicada boneca para ilustrar um método cruel de execução — popularmente conhecido como "microondas" — em que a vítima é colocada no meio de uma pilha de pneus que são queimados sem dó nem piedade.


Sem nenhum tipo de preconceito, com um olhar quase infantil, Zé Pretinho tenta retratar tudo que mexe com o povo de alguma maneira.


— Você vê aí as pessoas falando do Bin Laden. Osama Bin Laden. Fez tanta maldade por aí e viveu tão pouco. Eu não sou ninguém pra julgar. Ninguém sabe o que se passou, né? Então, ele é um personagem e eu retratei ele. Graças a Deus que no nosso país não existe isso de terrorismo. Eu tenho que dizer: sou muito feliz por ser brasileiro.


O pessoal do 24º Batalhão da Polícia Militar de Diadema também foi homenageado com sirenes, carrinhos de polícia e um fuzil feito de cabo de pá.


Solteiro, Zé Pretinho diz que não tem pressa de encontrar uma mulher em sua vida.
— Cada coisa no seu tempo, né?


Cada boneco que ganha uma forma e uma "legenda" é como uma postagem no mural do Facebook. Só que a rede social do Zé Pretinho fica a céu aberto, no meio da periferia de São Paulo. Ele faz questão de frisar que, apesar do capricho na hora de montar as bonecas, o mais importante é a mensagem.
— É a filosofia urbana.





Foto: Eduardo Enomoto/R7