Há um problema sério com o Oscar 2016. E não é (só) a
branquidez dos indicados. Incapaz de dialogar com o mundo real, refletir o
gosto do público ou, pelo menos, reconhecer o que há de melhor em termos de
qualidade cinematográfica, o prêmio se fecha cada vez mais em seu clube
exclusivo e chuta para fora quem realmente o torna relevante: o público de
cinema.
O movimento #OscarSoWhite (Oscar tão branco) foi apenas a
faísca para que uma discussão muito mais ampla começasse a se formar em torno
da principal festa do cinema mundial: será que devemos continuar valorizando
tanto aquela estatueta dourada, ou terá chegado o momento de olhar para outros
prêmios e festivais? Uma rápida análise da lista de indicados pode ajudar na
discussão.
Entre os títulos na corrida por Melhor Filme, temos apenas
um sucesso de crítica e público (“Mad Max: Estrada da Fúria”), um sucesso de
crítica sem público (“O Quarto de Jack”) e os demais, figurinhas mornas que
agradaram a alguns e não impressionaram os outros.
Há o caso do voto por simpatia (“Ponte dos Espiões”, um dos
filmes mais fracos de Steven Spielberg), do voto por provocação (“A Grande
Aposta” e “Spotlight”, nenhum deles tão fortes a ponto de serem lembrados daqui
a um ano, mas ambos polêmicos) e do voto por, vá entender, um bom trabalho de
marketing talvez (“Perdido em Marte” e “O Regresso”, superproduções que não
oferecem grande coisa sob a superfície). Como já é tradição, há ainda a ovelha
negra da competição, aquele filme que ninguém viu, mas que entra para dar a
impressão de que todos foram considerados (“Brooklyn”).
Se o objetivo era reconhecer obras que dialogassem com
questões atuais, “Carol”, “A Garota
Dinamarquesa” e “Straight Outta Compton” poderiam ter entrado. Se a ideia era
premiar o cinema como entretenimento, “Creed” e “Star Wars: O Despertar da
Força” deveriam estar na disputa. Se o foco era qualidade técnica e narrativa,
“Divertida Mente”, “Sicario” e “A Travessia” eram candidatos mais fortes. Isso,
levando em conta apenas os filmes em língua inglesa, já que estamos falando de
Oscar.
É claro que a escolha dos candidatos é pessoal, mas há ainda
outra questão em jogo: a Academia não necessariamente votou errado, mas limitou
suas opções ao manter a velha cegueira diante do mundo real: deixou de lado os
(excelentes) filmes com protagonistas negros, latinos, homossexuais e trans e,
entre as mulheres, reconheceu apenas as que interpretaram mães ou esposas,
deixando de fora a protagonista mais subversiva da temporada, Charlize Theron
(apesar das dez indicações do filme, nenhuma foi para ela). A exceção foi na
categoria de Atriz Coadjuvante, com a indicação de Jennifer Jason Leigh.
Houve avanços, contudo. A indicação de “Mad Max: Estrada da
Fúria” a Melhor Filme mostra uma disposição da Academia em reconhecer uma
tendência mercadológica e, pelo menos, tentar se alinhar com o público.
Praticamente todos os grandes sucessos de 2015 foram sequências ou reboots, ou
ambos, e vê-los admitir que pode haver qualidade nesse tipo de obra é um grande
passo.
A cerimônia de entrega dos Oscars vai ao ar no dia 28 de
fevereiro e, desta vez, grande parte do público não assistirá à festa para
conhecer os vencedores (afinal, muitos nem assistiram aos principais
indicados), mas sim para acompanhar os desdobramentos da polêmica envolvendo a
falta de candidatos negros. Isso pode ser triste para o cinema, mas é bom para
o mundo. Afinal, o palco do Teatro Dolby poderá finalmente servir para mudar
alguma coisa.
Fonte: Guiadasemana
por Juliana Varella redatora